Por que devemos ser contra a PEC nº 65/2023?

A Proposta de Emenda à Constituição nº 65 de 2023 (PEC 65/2023), atualmente em tramitação no Senado Federal, tem provocado um intenso debate tanto no meio econômico quanto na sociedade civil. Esta proposta busca transformar o Banco Central do Brasil (Bacen) em uma instituição de natureza especial, estruturada como empresa pública, dotada de autonomia técnica, operacional, administrativa, orçamentária e financeira. Embora, à primeira vista, tal mudança pareça fortalecer a atuação do Bacen, na prática, ela traz riscos consideráveis para a estabilidade econômica, a segurança jurídica e, sobretudo, para o interesse público.

De forma resumida, a PEC visa conceder ao Bacen independência financeira plena, retirando-o do orçamento da União. Além disso, transfere seu regime jurídico de autarquia para empresa pública, ainda que mantendo a fiscalização pelo Congresso Nacional e pelo Tribunal de Contas da União (TCU).

Apesar dos argumentos favoráveis, é fundamental refletir sobre os riscos e impactos negativos. Por isso, apresento abaixo uma análise aprofundada dos motivos que me levam a ser contrário à PEC 65/2023.

1. Insegurança Jurídica e Fragilidade na Contratação de Servidores

Primeiramente, transformar o Bacen em empresa pública implica substituir o regime jurídico de direito público pelo de direito privado. Isso gera sérias incertezas quanto às garantias legais, tanto institucionais quanto dos servidores.

  • Atualmente, os servidores do Bacen possuem estabilidade, proteção contra demissões arbitrárias e regulação via concursos públicos.
  • Com a PEC, tais vínculos seriam fragilizados, visto que empresas públicas seguem outra lógica de contratação, frequentemente baseada na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que não oferece estabilidade.

👉 Consequência direta: Maior vulnerabilidade a pressões externas, riscos de ingerência do mercado sobre decisões internas e até práticas de aparelhamento.

2. Precarização dos Serviços Prestados à Sociedade

Além disso, a alteração da natureza jurídica pode desencadear uma precarização dos serviços oferecidos pelo Bacen, essencialmente por três motivos:

  • Flexibilização dos processos internos: A busca por resultados operacionais pode priorizar eficiência financeira em detrimento da qualidade técnica.
  • Desvalorização do corpo técnico: A substituição de servidores concursados por contratos temporários ou terceirizados pode comprometer a excelência técnica.
  • Menor proteção ao interesse público: A lógica empresarial, por definição, visa resultados e não necessariamente o cumprimento de missões públicas, como garantir a estabilidade monetária e controlar a inflação.
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3. Subordinação aos Interesses do Mercado Financeiro

Outro ponto crítico — e talvez o mais preocupante — é que, embora a PEC alegue ampliar a autonomia, ela pode, paradoxalmente, subordinar o Bacen ao mercado financeiro, por meio dos seguintes mecanismos:

  • Formação do Conselho Deliberativo: A PEC sugere que a governança passe a incluir representantes do setor privado e da sociedade civil. Isso pode gerar conflitos de interesse, pois quem deveria ser regulado poderá influenciar diretamente as decisões do órgão regulador.
  • Pressões por resultados financeiros: Ao se comportar como uma empresa, o Bacen pode priorizar práticas que atendam aos interesses do mercado, muitas vezes em detrimento das necessidades econômicas da população.

👉 Exemplo prático: Imagine uma situação de crise econômica em que seria necessário reduzir os juros rapidamente para estimular a economia. Com influência direta do mercado, o Bacen poderia ser pressionado a manter juros altos para favorecer investidores, ignorando os impactos sociais.

4. Risco de Supersalários e Descontrole Orçamentário

Outro efeito colateral relevante da PEC 65 é a possibilidade de surgimento de supersalários, especialmente nos cargos de diretoria e presidência.

  • Atualmente, os salários do Bacen seguem os tetos constitucionais do funcionalismo público.
  • Com a transformação em empresa pública, essa limitação poderia ser revista, permitindo salários equiparados ao setor financeiro privado, que são exponencialmente maiores.

🔴 Consequência: Aumento expressivo dos custos administrativos, colocando em risco a sustentabilidade financeira do próprio Bacen.

Cenário AtualCom PEC 65/2023
Limitação salarial ao teto constitucionalPossibilidade de supersalários sem limite definido
Contratação via concurso públicoContratação via CLT, PJ ou terceirização
Estabilidade dos servidoresInstabilidade e alta rotatividade
Atuação focada no interesse públicoPotencial submissão aos interesses do mercado

5. Fiscalização Política Excessiva e Redução da Autonomia Real

Embora os defensores da PEC argumentem que a fiscalização pelo Congresso e pelo TCU garante transparência, na prática, isso pode ser um fator de risco. A depender da composição política, a interferência pode ser ainda maior do que no modelo atual, enfraquecendo, na prática, a autonomia que a PEC supostamente busca garantir.

  • Além disso, a composição de um Conselho com membros externos abre espaço para lobbies econômicos e políticos, afetando diretamente a credibilidade das decisões de política monetária e cambial.

6. Análise Gráfica dos Impactos Potenciais

📊 Impactos Potenciais da PEC 65/2023

AspectoSituação AtualSituação com PEC 65
Segurança JurídicaAltaBaixa
Qualidade dos ServiçosAltaModerada
Autonomia MonetáriaModeradaBaixa (sob risco)
Influência do MercadoControladaElevada
Risco FiscalControladoAlto

Conclusão

Diante de tudo que foi exposto, fica evidente que a PEC 65/2023, embora se apresente como uma proposta para reforçar a autonomia do Banco Central, na verdade, traz riscos severos e contradições estruturais. Ela compromete a segurança jurídica, precariza os serviços públicos, abre espaço para a influência excessiva do mercado financeiro e coloca em risco a sustentabilidade orçamentária da própria instituição.

Portanto, é imperativo que o debate público seja ampliado. Mais do que discutir a autonomia orçamentária, é preciso refletir profundamente sobre o modelo de Estado que queremos construir. Um Estado que se submeta ao mercado, ou um Estado capaz de regular, proteger e priorizar os interesses da sociedade brasileira.

por Mano Graal

Fonte: Senado / Brasil de Fato

Foto: Leonardo Sá/Agência Senado