CONTRA O FIM DA JORNADA 6×1, CONTRA O TRABALHADOR

A discussão sobre a proposta que prevê o fim da jornada 6 ×1 (seis dias consecutivos de trabalho para um dia de descanso) ganha fôlego nas ruas, mas encontra resistência no Congresso Nacional. Pesquisa recente do Instituto Quaest revela que 70% dos deputados federais são contrários à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que busca instituir jornadas semanais de quatro dias, totalizando 36 horas de trabalho — sem redução salarial. A proposta, de autoria da deputada Erika Hilton (Psol-SP), visa adaptar o país a modelos mais humanizados e eficientes de organização laboral, já adotados ou testados em diversas partes do mundo.

Levantamento da Quaest expõe resistência parlamentar

A pesquisa da Quaest entrevistou 203 deputados federais (40% do total da Câmara) entre 7 de maio e 30 de junho de 2025. A amostra considerou região geográfica e espectro ideológico dos partidos, com margem de erro de 4,5 pontos percentuais. A seguir, os principais resultados:

Tabela 1: Opinião Geral dos Deputados sobre o fim da escala 6×1

Posição dos DeputadosPercentual
Contra a PEC70%
A favor da PEC22%
Não sabem / Não responderam8%

Essa divisão mostra uma tendência clara de rejeição a jornada 6 ×1, com apoio minoritário mesmo dentro da base governista.

Polarização ideológica amplia divergências

Os dados tornam-se ainda mais relevantes quando analisados por espectro político.

Na esquerda, o apoio a jornada 6 ×1 é dividido, o que evidencia a complexidade da proposta mesmo entre aliados naturais do projeto. Já no centro e na direita, a rejeição é esmagadora. A narrativa dominante nesses grupos é que a medida prejudicaria a produtividade empresarial.

A base do governo também está dividida

Mesmo entre deputados da base governista, que historicamente defendem pautas trabalhistas, apenas 44% são a favor da PEC, enquanto 55% se posicionam contra.

Mapa 1: Distribuição regional da posição dos deputados da base governista

  • Nordeste: 61% a favor
  • Sudeste: 38% a favor
  • Sul e Centro-Oeste: 29% a favor
  • Norte: 41% a favor

Esse mapa revela que o Nordeste se destaca como a região mais favorável à mudança, refletindo sua maior concentração de movimentos sociais e sindicatos atuantes.

Proposta avança nas ruas, mas não no Congresso

Apesar da resistência política, o projeto conta com forte apoio social. O movimento Vida Além do Trabalho (VAT), originado no Rio de Janeiro, lançou um abaixo-assinado que já ultrapassou 1,5 milhão de assinaturas.

O engajamento nas redes sociais, aliado à cobertura de influenciadores digitais e sindicatos, pressionou parlamentares, ainda que de forma insuficiente até agora.

Argumentos em disputa: saúde x produtividade

De um lado, defensores da PEC alertam para problemas de saúde física e mental causados pela escala 6×1, especialmente em setores operacionais, de segurança e de atendimento ao público. A jornada atual, segundo estudos internacionais, reduz qualidade de vida, aumenta o risco de burnout e diminui a eficiência no longo prazo.

Do outro lado, representantes do setor empresarial e parte dos congressistas argumentam que a mudança impactaria negativamente na produtividade e nos custos operacionais, exigindo contratações adicionais para cobrir os turnos de trabalho perdidos.

Uma tendência internacional ignorada

Diversos países têm experimentado a semana de 4 dias com 100% do salário, como Islândia, Espanha, Reino Unido e Bélgica. Os resultados apontam para aumento de produtividade, queda nas taxas de burnout e maior engajamento dos funcionários.

Tabela 2: Resultados de projetos-piloto internacionais

PaísModelo TestadoResultados
Islândia36h semanaisProdutividade igual ou maior
Reino Unido4 dias, 100% salárioQueda de 71% nos casos de burnout
BélgicaDireito à semana de 4 diasAumento da satisfação no trabalho

O Brasil, porém, ainda resiste institucionalmente a essa mudança, mesmo com crescente apoio popular.

PEC parada na Câmara desde fevereiro

Mesmo tendo sido protocolada em fevereiro de 2025, a PEC ainda não entrou em tramitação oficial. O projeto visa alterar o artigo 7º da Constituição, que trata dos direitos fundamentais dos trabalhadores urbanos e rurais. Portanto, a lentidão no processo evidencia o descompasso entre o Legislativo e a sociedade civil organizada.

Conclusão: Uma disputa que ultrapassa o relógio de ponto

A resistência de 70% dos deputados federais ao fim da escala 6×1 revela não apenas uma barreira política, mas uma divergência profunda entre os interesses do capital e os direitos trabalhistas. Enquanto a sociedade civil se mobiliza em defesa de um modelo mais saudável e produtivo, parte significativa do Congresso permanece presa a lógicas antiquadas de produtividade.

A PEC proposta por Erika Hilton é mais do que uma pauta trabalhista; é um símbolo de uma nova cultura do trabalho, voltada à qualidade de vida e à eficiência sustentável. Enfim, se o Brasil deseja acompanhar as transformações globais, o Congresso precisará ouvir mais do que o lobby empresarial — e prestar atenção às vozes nas ruas.

por Mano Graal

Fonte: BdF

Imagens: ChatGPT / Daniel Neves Silva (Mundo Educação.uol)